Boca aberta

Por menção ao silêncio do réu, TJ-SP anula júri que o condenou a 32 anos

Autor

13 de junho de 2025, 20h58

Fazer referência ao uso do direito ao silêncio pelo réu em desfavor dele durante os debates do Tribunal do Júri viola o Código de Processo Penal (Decreto-Lei 3.689/1941) e resulta na anulação do julgamento.

TJ-SP anula julgamento que condenou homem a 32 anos por menção ao silêncio do réu

Em sessão do júri, promotor de Justiça disse que o réu poderia ter se explicado, mas preferiu ficar em silêncio

Assim entendeu a 13ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo ao anular um julgamento da 2ª Vara do Júri e das Execuções Criminais de Ribeirão Preto (SP) que condenou o réu a 32 anos de reclusão em regime inicial fechado por homicídio em grupo de extermínio. Com isso, o processo foi encaminhado ao juízo de origem para a promoção de um novo julgamento.

O colegiado tomou a decisão ao analisar o recurso de apelação do acusado contra a sentença de primeira instância.

Segundo os autos, a denúncia foi analisada pelo Tribunal do Júri em junho de 2024. Na sessão, o representante do Ministério Público mencionou o fato de o réu ter escolhido ficar em silêncio durante o interrogatório ao qual foi submetido durante as investigações do crime.

A defesa, então, pediu a anulação do julgamento com base no artigo 478, inciso II, do P. O dispositivo prevê a nulidade dos debates do Tribunal do Júri quando forem feitas menções ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento.

Garantia constitucional

O relator do recurso no TJ-SP, desembargador Rodrigues Torres, deu razão ao argumento defensivo.

O direito ao silêncio, expressamente garantido no artigo 186 do P, é um dos principais institutos principiológicos que estruturam o Direito Processual Penal. O réu tem o direito de não produzir prova contra si mesmo. Assim, caso o réu opte pelo exercício desse direito, seja por orientação da defesa técnica, seja por vontade pessoal, em juízo ou na fase investigativa, não pode o julgador levar em consideração seu silêncio para presumi-lo culpado, nem para fundamentar uma condenação”, escreveu o magistrado.

“A necessidade de preservação da incolumidade desse direito é tão importante e imprescindível que o legislador, com relação ao Tribunal do Júri, proibiu, explicitamente, qualquer menção argumentativa e crítica ao silêncio do acusado. É que os jurados, que são leigos, não podem ser influenciados por argumentação ilícita que viola um direito constitucional e convencional do acusado. Aliás, a desobediência a essa proibição implica violação ética a princípios que devem ser preservados para a indenidade de nossa sociabilidade democrática. É por tudo isso que a desobediência a essa norma proibitiva implica nulidade do julgamento.”

O relator observou ainda que a ata do julgamento atacado informa que o promotor de Justiça falou que o réu poderia ter se explicado durante a fase policial do processo, mas manteve-se em silêncio.

“Essa argumentação, de forma ilícita e nada ética, despreza a máxima de que o acusado não tem a obrigação de oferecer explicações e tem o direito ao silêncio exatamente porque tem o direito de não produzir provas contra si mesmo. Essa postura do promotor de Justiça durante o julgamento é inissível e expressamente proibida pelo ordenamento jurídico”, acrescentou.

Participaram do julgamento os desembargadores Augusto de Siqueira e Moreira da Silva. O advogado Mauro Ribas representou o réu.

Clique aqui para ler o acórdão
Processo 1506711-15.2022.8.26.0506

Autores

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!